Como a Inteligência Artificial pode transformar o Setor Energético?

A Inteligência Artificial é aliada essencial para um sistema energético mais eficiente, resiliente e sustentável

A revolução digital e a transição energética estão se cruzando de forma cada vez mais intensa — e no centro desse encontro está a Inteligência Artificial (IA). Mais do que uma tendência tecnológica, a IA tem se mostrado uma ferramenta estratégica para resolver alguns dos desafios mais complexos do setor energético: da previsão da demanda à integração de fontes renováveis, da automação industrial à eficiência no consumo.

Mas, como revela o novo relatório da Agência Internacional de Energia (IEA), essa transformação exige atenção: a IA consome muita energia, ao mesmo tempo em que pode ser uma aliada poderosa para usar melhor cada quilowatt gerado. Neste artigo, exploramos como essa relação pode redesenhar o futuro da energia, tornando-o mais eficiente, resiliente e sustentável.

A interseção entre energia e inteligência artificial: um novo capítulo

Nos últimos anos, a Inteligência Artificial (IA) deixou de ser apenas uma promessa tecnológica para se tornar uma ferramenta concreta de transformação em diversos setores — e o setor energético está entre os mais impactados por esse avanço. Dessa maneira, segundo o mais recente relatório especial da Agência Internacional de Energia (IEA) – Energia e IA, a IA tem o potencial de impulsionar grandes ganhos de eficiência, reduzir custos operacionais, melhorar a resiliência das redes elétricas e acelerar a transição global para fontes de energia mais limpas.

Mas existe uma realidade que não pode ser ignorada: não há IA sem energia. Nesse sentido, compreende-se que o funcionamento de modelos de IA exige uma infraestrutura robusta, especialmente em data centers — que hoje consomem volumes massivos de eletricidade. Bem como, essa demanda por eletricidade está centralizada nas regiões com maior número de data centers instalados.

Na Irlanda, por exemplo, os data centers consomem cerca de 20% do fornecimento de eletricidade medido. Há seis estados nos Estados Unidos onde os data centers já consomem mais de 10% do fornecimento de eletricidade, com a Virgínia liderando com 25%. 

Fonte: Understanding the energy-AI nexus

Para se ter uma ideia, um único data center voltado para aplicações de IA pode consumir tanta energia quanto 100 mil residências. Os maiores, ainda em construção, devem chegar a vinte vezes esse valor.

Diante desse cenário, é fundamental que a relação entre IA e energia seja compreendida e planejada de forma estratégica. A tecnologia, quando bem integrada, pode deixar de ser uma consumidora voraz e se tornar parte da solução para os desafios energéticos do futuro.

A inteligência artificial como vetor de eficiência energética

Dessa maneira, a adoção da IA no setor de energia já é uma realidade em diversas áreas, indo muito além de projetos-piloto. Empresas estão utilizando algoritmos inteligentes para otimizar desde a produção até o consumo final de energia. Abaixo, detalhamos como isso está acontecendo:

Gestão de redes elétricas

As redes estão cada vez mais descentralizadas, complexas e digitalizadas. Nesse sentido, a IA se torna essencial para prever a demanda, integrar fontes renováveis com maior precisão e detectar falhas em tempo real. Isso resulta em menos interrupções, melhor aproveitamento da infraestrutura existente e, em muitos casos, dispensa a necessidade de construir novas linhas de transmissão.

Estima-se que até 175 GW de capacidade de transmissão poderiam ser liberados apenas com o uso de sensores inteligentes e algoritmos de controle, o que supera a carga adicional esperada de energia para data centers até 2030. Assim, empresas como a National Grid (Reino Unido) utilizam IA para prever a demanda elétrica com mais precisão, reduzindo o desperdício e aumentando a integração de fontes renováveis na rede.

Geração e transmissão mais inteligentes

Em suma, a IA também vem sendo usada para otimizar o desempenho de turbinas eólicas, usinas solares e até reatores nucleares. Com ela, é possível antecipar manutenções, prever falhas e ajustar parâmetros em tempo real, aumentando a vida útil dos ativos e reduzindo perdas operacionais.

A GE Vernova e a Siemens Energy adotam plataformas baseadas em IA para otimizar a operação de turbinas eólicas e usinas térmicas, permitindo ajustes em tempo real que aumentam a eficiência e a longevidade dos equipamentos. Já na indústria, empresas como a Schneider Electric e a ABB lideram o uso de IA na automação e digitalização de processos, reduzindo perdas de energia em fábricas e instalações industriais.

Eficiência em edifícios e indústrias

Sistemas baseados em IA permitem que prédios residenciais e comerciais controlem de forma inteligente o uso de eletricidade, principalmente em climatização. Já na indústria, a automação inteligente é capaz de reduzir desperdícios, melhorar a qualidade de produtos e cortar custos. Segundo a IEA, a economia de energia nesse setor pode ultrapassar o consumo anual de países inteiros, como o México.

Transporte e mobilidade

Primordialmente, a IA já está presente em aplicativos de navegação, gerenciamento de frotas, manutenção preditiva e veículos autônomos. Essas soluções aumentam a eficiência energética dos sistemas de transporte, ainda que apresentem riscos de “efeito rebote”, como o aumento da mobilidade individual em detrimento do transporte coletivo.

Desafios para a adoção em larga escala

Apesar do grande potencial, a adoção da IA no setor energético ainda encontra algumas barreiras. A primeira delas é a falta de acesso a dados estruturados e confiáveis, essenciais para o funcionamento dos modelos de machine learning. Além disso, muitas empresas ainda não possuem a infraestrutura digital necessária ou profissionais capacitados para conduzir a transformação digital.

Outro ponto de atenção está na segurança. O aumento de ataques cibernéticos a empresas de energia nos últimos anos levanta alertas sobre como proteger sistemas críticos que se tornam cada vez mais conectados e inteligentes. A IA, paradoxalmente, também é uma aliada na defesa, com soluções que detectam ameaças digitais e físicas de forma muito mais rápida e precisa.

Além disso, a localização dos data centers exige atenção especial. Eles devem ser construídos em regiões com alta disponibilidade de energia e capacidade de rede elétrica, sob risco de sobrecarregar sistemas já pressionados, atrasar projetos e gerar conflitos com outros objetivos, como a eletrificação da mobilidade e o crescimento da manufatura.

Oportunidades para o Brasil e outras economias emergentes

O relatório da IEA destaca que, embora países como Estados Unidos e China concentrem a maior parte da infraestrutura de IA e data centers, há oportunidades significativas para países com energia limpa e acessível. O Brasil, com sua matriz majoritariamente renovável e capacidade técnica crescente, pode se posicionar como um hub estratégico de IA aplicada à energia.

Já existem experiências positivas em economias em desenvolvimento, com o uso de IA para monitorar redes elétricas rurais, otimizar sistemas de irrigação baseados em energia solar e até prever falhas em microgrids. Por fim, o desafio agora é escalar essas soluções, rompendo as barreiras da digitalização.

O futuro da energia será digital — e inteligente

A Inteligência Artificial é uma das ferramentas mais promissoras para enfrentar os desafios da transição energética. À medida que o setor incorpora mais fontes renováveis, se descentraliza e se digitaliza, a IA pode ser a engrenagem que mantém tudo funcionando de forma eficiente, resiliente e segura.

No entanto, é preciso agir com planejamento, regulamentação clara e investimentos em formação de talentos. A IA só entregará seu potencial transformador no setor energético se for tratada como parte de uma estratégia sistêmica — e não apenas como uma inovação pontual

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Assine nossa Newsletter

E fique antenado de todos os assuntos.